Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília (1989), mestrado em Ciência Social (Antropologia Social) pela Universidade de São Paulo (1993) e doutorado em Antropologia pela Universidade de Brasília (1999). Atualmente é professor do Departamento de Antropologia (DAN) da Universidade de Brasília (UnB). Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Teoria
Antropológica, atuando principalmente nos seguintes temas: teoria antropológica, teoria das trocas, antropologia do estado, direito, linguagem, congresso nacional e etnografia constitucional.
O Estado contra a sociedade
O projeto "Estado contra sociedade" procura examinar a relação entre a política e o direito como fazendo parte de um sistema e retirar daí os seus possíveis desdobramentos. Com isso quero dizer que muitas das ações, palavras e práticas da política ganham sentido em relação à maneira como o direito brasileiro imagina, discorre sobre, elabora, discute e aplica as normas jurídicas, e as práticas judiciárias com as quais todo este elaborado sistema de representações caminha. E vice-versa. Isso talvez seja verdadeiro para qualquer Estado moderno, mas também não seria menos plausível dizer que as diversas tradições, culturas ou ideologias vão, cada uma a seu jeito, interpretar e, dessa forma, construir esta relação. Pretendo argumentar que o traço determinante, no caso brasileiro, é a ideia de que o Estado deve construir-se contra a sociedade (Abreu 2014; Abreu 2013).
A ideia de que o Estado se constrói contra a sociedade representa uma violação da filosofia política mais recente e da filosofia do direito que se constrói a partir de uma teoria da política (por exemplo Dworkin 2007, Rawls 1999, Walzer 1983, para citar alguns dos mais recentes). Para estas, a relação entre Estado, direito, política e sociedade têm como valor determinante a coerência. Aliás, a ideia não é tão nova quanto a citação de autores mais recentes faz parecer. Tocqueville já mostrava que a democracia estadunidense era a realização, no plano institucional, de uma sociedade e uma cultura profundamente democráticas. Seja como for, da perspectiva dos autores acima, o direito e o Estado representariam uma maneira de ser, uma sociabilidade e uma identidade próprias da sociedade na qual se inserem. E mesmo quando a técnica jurídica se distancia da realidade social para bem cumprir o seu papel (Thomas 2011), é somente em relação à coerência — ou integridade para utilizar o termo de Dworkin (2007) — que a distância faz sentido. Em outras palavras, a distância é um domínio derivado da unidade e submetido a ela. Proponho tomar a filosofia política e a teoria jurídica mais recentes como pólos comparativas, cuja vantagem para o nosso argumento é a capacidade de dei- xar mais claras as especificidades do nosso próprio sistema (Abreu 2006). No caso Brasileiro, vou argumentar que acontece o inverso. Há uma ruptura proposital, um estranhamento estratégico entre o pólo formado pelo direito e pelo Estado e o pólo que inclui a política e a sociedade. Não há um plano superior capaz de incorporar a unidade. A minha hipótese de pesquisa é que é preciso ver no distanciamento, na ruptura, o fenômeno logicamente anterior e, portanto, estruturante de todo o resto.
2020
Antropologia das Práticas de Poder